Dia Mundial da Contraceção

Sílvia Rodrigues, Licenciada em Sociologia e membro do nascer.pt

O Dia Mundial da Contraceção celebra-se anualmente no dia 26 de setembro. Foi estabelecido para destacar a importância da contraceção na vida das pessoas e promover o acesso a métodos contracetivos eficazes, ou seja, a importância do acesso à contraceção como uma componente fundamental da saúde sexual e reprodutiva. Assim sendo, pode-se afirmar que este dia tem como “objetivo consciencializar os cidadãos para a importância da saúde física, mental, sexual e reprodutiva” (Costa, 2021).

Num mundo em constante evolução, a contraceção desempenha um papel fundamental na configuração das dinâmicas sociais, especialmente nas áreas de saúde sexual e reprodutiva, sendo considerada, pela Organização Mundial de Saúde (OMS) “como um investimento prioritário no bem-estar da população” (Costa, 2021).

Como explica Cabral (2017, p. 1093):

“A prática contraceptiva compreende uma série de decisões e lógicas complexas entranhadas em múltiplos domínios da vida, requerendo análises acerca de práticas e representações sobre contracepção, maternidade, conjugalidade, família, prazer e sexualidade, sem que se deixe de considerar aspectos materiais cruciais como a oferta contraceptiva (disponibilidade de serviços e métodos). ”

Nesse sentido e de forma a contribuir para uma sociedade saudável e responsável, com base na saúde e na educação, é fundamental que o Estado garanta a “a educação sexual, o acesso ao planeamento familiar, a assistência na interrupção de gravidez em condições equitativas e de segurança” (Ordem dos enfermeiros centro, 2019). Portanto, “os Estados devem considerar prioritário a prevenção da gravidez não desejada através da promoção do planeamento familiar e da educação sexual. A acessibilidade aos cuidados de saúde reprodutiva deve ser garantida universalmente e livre de discriminação” (High Commissioner for Human Rights, como citado em Sociedade Portuguesa da Contracepção [SPDC], s.d.).

No nosso país, “o acesso ao planeamento familiar, aos contracetivos, à contraceção de emergência e à interrupção voluntária da gravidez, por opção da mulher, estão devidamente fundamentados na legislação (Lei n.º 16/2007 de 17/04/2007) e no quadro normativo que norteia o Serviço Nacional de Saúde (SNS)” (Ordem dos enfermeiros centro, 2019).

Segundo a Associação para o Planeamento da Família [APF] (2016), em Portugal, 94% das mulheres com vida sexual ativa usam contraceção, colocando o nosso país entre “os países onde o uso de contraceção é maior” (Estudo das Práticas contracetivas das mulheres em Portugal, 2015, como citado em citado em (SPDC, s.d.).

Como referido pela APF (2016), a maioria das mulheres que usa métodos contracetivos escolheu um método moderno, sendo a pílula a mais comum[1]; cerca de 80% das mulheres que usam preservativos fazem-no tanto para contraceção, quanto para prevenção de doenças sexualmente transmissíveis1; verificou-se uma redução gradual no número de interrupções de gravidez realizadas por escolha da mulher, de 2015 para 2016, essa redução foi de 1,9%, e entre 2008 e 2015, a queda foi de 10%2; o número de interrupções de gravidez por escolha da mulher em Portugal é menor do que a média europeia2; a grande maioria (96%) das mulheres que passaram por uma interrupção de gravidez optou por usar algum método contracetivo, sendo que 38% escolheu um método de longa duração2; e, não houve nenhuma morte materna relacionada ao aborto3.

No entanto, no que diz respeito à contraceção e sexualidade, apesar da legislação portuguesa contemplar consultas de Planeamento Familiar gratuitas, ainda existem dados preocupante em Portugal.

A Sociedade Portuguesa da Contracepção (s.d.) refere que, segundo os dados do Estudo das Práticas contracetivas das mulheres em Portugal,  40% da população, não frequenta consulta de Planeamento Familiar, sendo este valor de 90% entre as adolescentes, o que significa que a igualdade no acesso à contraceção ainda não foi alcançada em condições de equidade para todos os cidadãos; cerca de 30% dos jovens não têm oportunidade de receber educação sexual, ou seja, a educação sexual ainda enfrenta obstáculos no que diz respeito ao acesso; a maioria das mulheres sexualmente ativas só está familiarizada com a pílula, o preservativo e o dispositivo intrauterino. Além disso, 15% dos adolescentes e 20% das mulheres com mais de 40 anos não têm conhecimento sobre a pílula de emergência, dados que refletem que a disponibilidade de informações sobre contraceção e sexualidade segura ainda é insuficiente; 20% dos adolescentes não usou preservativo na última relação sexual, e 16% tiveram relações sexuais sob a influência de álcool e/ou drogas, portanto, a disseminação de informações sobre a prevenção de comportamentos de risco, incluindo a violência de género, ainda é deficitária4.

Ainda de mencionar o resultado dos dados do Estudo das Práticas Contracetivas (2015) da Sociedade Portuguesa da Contraceção e Sociedade Portuguesa de Ginecologia, que preocupam a Associação para o Planeamento da Família (2016): 6% das adolescentes e 8% das mulheres com mais de 40 anos não usam contraceção, o que significa que é nos extremos da vida reprodutiva que o uso de contraceção é menor; mais de 40% das mulheres que usa pílula, com idade inferior a 29 anos, faz uma utilização de forma irregular; a Interrupção de Gravidez nas mulheres de nacionalidade estrangeira aumentou de 16% em 2013 para 17,2% em 2014 e 18,5% em 2015; apesar de em 2009 a educação ter sido considerada obrigatória no plano curricular, em 2015 apenas 67,4% dos jovens mencionaram que tiveram acesso a educação sexual/informação sobre contraceção e prevenção de infeções sexualmente transmissíveis.

Nesse sentido a Associação para o Planeamento da Família considera que “o acesso, as condições de prestação de cuidados de saúde reprodutivos e possibilidade de opção pelos métodos de contraceção têm muitas assimetrias no país, não assegurando condições igualitárias a todos os cidadãos” (APF, 2016).

Podemos concluir que o Dia Mundial da Contraceção desempenha um papel fundamental na sociedade contemporânea, destacando a importância da contraceção para as relações de género, o planeamento familiar e a autonomia das pessoas. Através da consciencialização e da promoção do acesso igualitário a métodos contracetivos eficazes, podemos continuar a moldar uma sociedade mais igualitária e justa, onde as escolhas reprodutivas são respeitadas. Todavia, é importante reconhecer que ainda há desafios a serem superados, e é fundamental que a sociedade continue a trabalhar para garantir que todas as pessoas tenham o direito e os meios para tomar decisões informadas sobre sua saúde sexual e reprodutiva. Como defende a OMS (como citado em SPDC, s.d.), a contraceção é um investimento prioritário no bem-estar da população que contribui para a redução dos fatores geradores de pobreza.

 

BIBLIOGRAFIA

Associação para o Planeamento da Família. (2016, setembro). Dia mundial da contraceção, 26 de setembro, 2016, O acesso à saúde sexual e reprodutiva é um direito fundamental do indivíduo. https://apf.pt/dia-mundial-da-contracecao/

Cabral, C. S. (2017). Articulações entre contracepção, sexualidade e relações de gênero. Saúde Soc. São Paulo, 26 (4), 1093-1104.

Costa, F. (2021, setembro). 26 Set | Dia Mundial da Contraceção. https://www.ordemenfermeiros.pt/acores/noticias/conteudos/26-set-dia-mundial-da-contraceção/

Ordem dos enfermeiros centro. (2019, setembro). Dia Mundial da Contracepção. https://www.ordemenfermeiros.pt/centro/noticias/conteudos/dia-mundial-da-contracepção-26-setembro/

Sociedade Portuguesa da Contracepção. (s.d.). 26 de setembro: Dia Mundial da Contracepção. https://www.spdc.pt/noticias/11-noticias/102-26-de-setembro-dia-mundial-da-contracecao-2

1 (Estudo das Práticas contracetivas, 2015. Sociedade Portuguesa da Contraceção, Sociedade Portuguesa de Ginecologia, como citado em APF, 2016)

2 (Relatório dos registos das interrupções da gravidez dados de 2015, Direção de Serviços de Prevenção da Doença e Promoção da Saúde, como citado em APF, 2016)

3 (Relatório de análise das complicações relacionadas com a interrupção da gravidez 2013 – 2014, como citado em APF, 2016)

4 (Health Behaviour in School-aged Children, como citado em Sociedade Portuguesa da Contracepção, s.d.)