Dia Internacional da Parteira
Sónia Cardoso Pintassilgo, Investigadora Integrada no CIES- Centro de Investigação e Estudos de Sociologia do Iscte
No Dia Internacional da Parteira celebra-se uma profissão com uma centralidade ímpar, cujo lugar e papel social se tem alterado, de acordo com a evolução da organização social do nascimento, da medicalização da sociedade e da afirmação dos papeis de género em contexto de saúde.
Em Portugal, essa mudança reflete-se em diferentes dimensões, nomeadamente, na formação, e na própria designação da profissão, que configura, atualmente, uma especialização da enfermagem. Reflete-se, também, no exercício da profissão, que pode medir-se, entre outros indicadores, pela presença destas profissionais de saúde nos nascimentos ocorridos no país. A determinação legal para que a assistência ao nascimento possa ser assegurada em exclusivo por enfermeiras/os obstetras impõe condições, mas existe. A evolução dos resultados dos ‘nados-vivos segundo a assistência’ dá conta de uma realidade que não se adapta a essa determinação e que se associa a outras particularidades das condições do nascimento.
Com efeito, a presença de enfermeiras/os obstetras no nascimento vem sendo minoritária em Portugal, quando comparada com a dos/os médicos/as. No ano de 2021, as/os enfermeiras/os obstetras (no verbete de registo do nado-vivo a designação da categoria é ‘enfermeira parteira’) assistiram 24,1% dos partos, enquanto 2/3 foram assistidos por médicos/as.
Portugal compara bem com países como os EUA, onde apenas 9,8% de nados-vivos foram assistidos por parteiras, em 2019 (NCHS Annual Birth Reports and Natality Datasets). Mas, enquanto naquele país o reconhecimento do aumento dos níveis de mortalidade materna vem determinando um peso crescente das parteiras no nascimento (apesar dos valores reduzidos), em Portugal, a tendência de uma maior presença da figura do/a médico/a no nascimento, em detrimento da da/o enfermeira/o obstetra, vem-se reforçando ao longo do tempo. Os resultados da última década (visíveis na figura) dão conta disso mesmo.
Em Portugal, estes resultados poderão ser lidos em articulação com indicadores como a taxa de cesarianas, que cresceu mais de 3 pontos percentuais em cinco anos – de 32,9% em 2015, para 36,3% em 2020 –, afastando-se claramente do intervalo de 10 a 15% recomendado pela Organização Mundial de Saúde, com riscos acrescidos para a saúde materna e infantil.
Assim, havendo evidência de que a presença das parteiras no nascimento impacta positivamente nos resultados em saúde materna e infantil, e sabendo-se que a frequência dos partos instrumentalizados em Portugal não só é superior ao recomendado, como apresenta, nos últimos anos, uma tendência crescente, dir-se-á que o reforço da presença das e dos enfermeiras e enfermeiros obstetras no nascimento, em Portugal, será uma garantia para o reforço de bons resultados em saúde materna e infantil.