Nascer antes do tempo: uma visão dos dados estatísticos sobre a prematuridade

por Sílvia Rodrigues, estudante de Sociologia e estagiária de investigação no nascer.pt

Segundo a Organização Mundial de Saúde (Organização Mundial de Saúde [OMS], 2022a) consideram-se prematuros os bebés nascidos vivos antes das 37 semanas de gravidez serem concluídas.

Segundo a Sociedade Portuguesa de Pediatria (2023) nascem anualmente 15 milhões de prematuros, ou seja 1 em cada 10 bebés nasce antes das 37 semanas de gestação, sendo que a taxa global de parto inferior às 37 semanas é de 11%, variando de 5% nos países da Europa a 18% em África. Em Portugal, atualmente, a prematuridade é cerca de 7,51%, ou seja, por cada 100 nados-vivos 7,51 são prematuros (figura 3).

“A prematuridade é decorrente de circunstâncias diversas e imprevisíveis, em todos os lugares e classes sociais” (Ramos & Cuman, 2009, p. 298), isto é, o parto prematuro pode ocorrer em qualquer parte do mundo e por vários fatores que não são expectáveis.

Nas palavras de Barbosa (2015) as causas intrínsecas ao nascimento prematuro são complexas e variadas, de difícil prevenção e antevisão. Como referido pela OMS, as múltiplas gravidezes, infeções e condições crónicas (como diabetes e pressão alta) podem estar na origem dos nascimentos prematuros. Bem como “um nascimento pré-termo prévio, reduzidas condições socioeconómicas, uso de drogas e reprodução medicamente assistida” (Barbosa, 2015, p. 6), também podem estar associadas ao aumento da prematuridade.

Na origem da prematuridade, também estão as “condições sociais adversas, como dificuldades económicas, problemas sociais e comportamentais, e baixo nível educacional, [que] estão positivamente correlacionadas com o aumento do risco de parto prematuro” (Antunes et al., 2021, pp. 29-30).

Como mencionado em Cunha (2018), um fator importante de salientar, que é conhecido como sendo uma das causas de prematuridade, é a idade materna extrema. Segundo os Indicadores demográficos do Instituto Nacional de Estatística (INE), a média de idade da mulher portuguesa, durante a primeira gravidez, em 2021, era de 30,9 anos. Todavia, “há cada vez mais mulheres que são mães depois dos 35 anos – idade a partir da qual aumenta o risco de nascer um prematuro” (Santos, 2021).

“O nascimento prematuro é um importante problema de saúde pública uma vez que é a principal causa de mortalidade neonatal em todo o mundo” (Barbosa, 2015, p. 39), traduzindo-se “as complicações do parto prematuro [na] principal causa de morte entre crianças menores de 5 anos de idade” (OMS, 2022a). Nesse sentido, em 2022, no Dia Mundial da Prematuridade (17 de novembro), o Departamento de Saúde Materna, Neonatal e Adolescente e Envelhecimento da Organização Mundial da Saúde de Genebra lançou novas recomendações baseadas em novas evidências que surgiram que podem melhorar o atendimento de bebés prematuros ou de baixo peso ao nascer. Existem 25 recomendações que expandem substancialmente o “o que”, “onde” e “como” para melhorar a sobrevivência, a saúde e o bem-estar de bebés prematuros e de baixo peso ao nascer. Isso inclui o cuidado da mãe canguru e o envolvimento das famílias no cuidado dos seus bebés desde o momento do nascimento (OMS, 2022b).

Devido à “imaturidade dos vários órgãos, nomeadamente cérebro, pulmão e intestino [que] obriga a uma intervenção altamente diferenciada” (Cunha, 2018), essas crianças podem enfrentar vários problemas de saúde, incluindo dificuldades respiratórias, problemas de alimentação e crescimento inadequado. Em alguns casos, como mencionado em Sereno (2013), o parto prematuro pode resultar em problemas de desenvolvimento a longo prazo, como atrasos no desenvolvimento cognitivo.

Em Portugal verifica-se uma “preocupação com a adaptação do sistema de saúde materno-infantil a novas realidades do nascimento, manifestada, por exemplo, pela preocupação com a prevenção da prematuridade” (Pintassilgo, 2014, p. 98). Nesse sentido, “a qualidade dos cuidados necessários aos prematuros nas unidades neonatais portuguesas segue as boas práticas internacionais, o que nos coloca, desde há vários anos, nos valores mais baixos da mortalidade neonatal dos países europeus” (Cunha, 2018).

Além disso, conforme explicado pela Sociedade Portuguesa de Pediatria (s.d.), os avanços na tecnologia médica, aliados ao conhecimento científico, incluindo melhores métodos de monitoramento fetal e terapias neonatais avançadas, têm permitido a sobrevivência de recém-nascidos prematuros. Como menciona Cunha (2018) apesar de ainda estarmos “longe das unidades neonatais com quartos familiares existentes em alguns países nórdicos e norte-americanos”, as unidades neonatais portuguesas, de forma a contribuírem para a melhoria da qualidade de vida dos bebés prematuros e das suas famílias já “incluem várias medidas, com destaque para o método canguru, manipulação mínima, regulação da luz e do ruído, massagem, posicionamento adequado e amamentação” (Cunha, 2018).

“Na década de 1990 ocorre uma série de avanços nos cuidados prestados aos bebés prematuros/bebés de baixo peso, que se traduzem num aumento da taxa de sobrevivência destes bebés de risco” (Sereno, 2013, p. 12). Em Portugal, segundo a Sociedade Portuguesa de Pediatria (s.d.) os avanços tecnológicos aliados ao conhecimento científico têm permitido a sobrevivência de bebés prematuros de idades gestacionais cada vez mais baixas. Segundo dados do INE (2023), a taxa de mortalidade neonatal (quociente entre os óbitos ocorridos entre o nascimento e os 28 dias de vida e o número de nados-vivos ocorridos ao longo de um ano) em 2021 era de 1,7 óbitos infantis até aos 28 dias de vida por cada mil nados-vivo, o “que coloca Portugal no 9º lugar entre 162 países, sendo o nosso país considerado um bom local para nascer e crescer” (Sociedade Portuguesa de Pediatria (s.d.)). No entanto, apesar desses esforços, os nascimentos prematuros ainda representam uma preocupação significativa em Portugal.

De acordo com as Estatísticas Demográficas do INE, em Portugal, nos últimos 21 anos, têm-se verificado várias oscilações nos valores dos nascimentos de nados-vivos prematuros registados, verificando-se um decréscimo no ano 2021 face a 2000. Com efeito, no ano 2000 registaram-se 7065 nados-vivos com menos de 37 semanas de gestação, tendo esse número diminuído, em 2001, para 6346. Entre esse ano e 2008 verificam-se algumas variações, sendo em 2008 o ano em que se regista o número mais elevado de nados-vivos prematuros (9293). É no ano 2020 que o registo de nados-vivos prematuros é mais baixo (5771). No entanto, o número de nados-vivos prematuros voltou a aumentar em 2021, com mais 209 nados-vivos prematuros face ao ano anterior. (figura 1).

Figura 1: Total de nados-vivos prematuros (n.º), Portugal, 2000-2021

Fonte: Elaborado por nascer.pt, INE (2023), Estatísticas Demográficas, 2000-2021, Portugal

          No período entre 2000 e 2021, em Portugal, verifica-se que a maior incidência de nascimento prematuros é nos bebés do sexo masculino (figura 2). Dos 159436 nados-vivos prematuros que nasceram nesse período em Portugal, 83521 são do sexo masculino e 75915 do sexo feminino. Tendência essa, possivelmente, explicada pelo facto de, em Portugal, ao longo desse mesmo período, segundo as Estatísticas Demográficas do INE, terem nascido mais nados-vivos do sexo masculino que do sexo feminino, 1100150 e 1039974, respetivamente. Estes resultados são compatíveis com a tendência apresentada na relação de masculinidade no nascimento, na generalidade das populações, que se situa em torno dos 105% (isto é, por cada 100 nados-vivos do sexo feminino ocorrem, aproximadamente, 105 do sexo masculino, na generalidade das populações).

Figura 2: Total de nados-vivos prematuros por sexo (n.º), Portugal, 2000-2021

Fonte: Elaborado por nascer.pt, INE (2023), Estatísticas Demográficas, 2000-2021, Portugal

Em Portugal, entre 2000 e 2021, o número de nados-vivos prematuros por cada 100 nados-vivos tem registado algumas alterações ao longo dos anos, sendo que o ano em que se registou uma maior percentagem de nados-vivos prematuros nos nados-vivos em Portugal foi em 2007, com um registo de 9,05 nados-vivos prematuros por cada 100 nados-vivos no nosso país. Por sua vez, o ano em que se registaram menos nados-vivos com menos de 37 semanas de gestação por cada 100 nados-vivos foi o de 2005 com 6,55 nados-vivos prematuros. Em 2021 e face a 2000, no nosso país, registou-se um acréscimo da percentagem de nados-vivos prematuros, passando de 5,89% para 7,51%, ou seja, em 21 anos, a taxa de prematuridade no nosso país, aumentou em mais 1,62 nados-vivos com menos de 37 semanas de gestação (figura 3). “Contudo, é necessário não esquecer o declínio alarmante da taxa de natalidade portuguesa, que, neste contexto, faz aumentar a prevalência da prematuridade no nosso país” (Barbosa, 2015, p. 4).

Figura 3: Proporção de nados-vivos prematuros no total de nados-vivos (%), Portugal, 2000-2021

Fonte: Elaborado por nascer.pt, INE (2023), Estatísticas Demográficas, 2000-2021, Portugal

Como mencionado por Lopes, et al. (2018), em todo o mundo, a taxa média dos prematuros ao nascimento é estimada em cerca de 10%, tendo a evolução científica e tecnológica no campo da neonatologia contribuído para o recente aumento significativo da sua taxa de sobrevivência. Também em Portugal, e de acordo com dados da Sociedade Portuguesa de Neonatologia (SPN), apesar da natalidade ter vindo a descer nos últimos anos, o número de recém-nascidos de extremo baixo peso (RNEBP) (…) tem vindo a aumentar. A imaturidade e complicações clínicas associadas à prematuridade originam frequentemente alterações no rastreio neonatal destes bebés, contribuindo para o aumento da percentagem de resultados falsos positivos e negativos no rastreio neonatal deste grupo de recém-nascidos.

Para enfrentar esses desafios e tendo como base as recomendações, lançadas em 2022, pela OMS para o cuidado do recém-nascido prematuro ou de baixo peso, o governo português deverá continuar a investir no desenvolvimento de políticas e programas de saúde dedicados à prematuridade, e a apoiar as famílias com bebés prematuros, incluindo o fornecimento de mais recursos e suporte financeiro.

Embora Portugal, desde o ano 2000, tenha feito alguns progressos na prevenção e acompanhamento de nascimentos prematuros, ainda há muito a ser feito para garantir que todas as crianças do país tenham a oportunidade de crescer e prosperar. Com esforços contínuos de profissionais de saúde, governo e organizações não governamentais, podemos trabalhar para reduzir ainda mais a taxa de nascimentos prematuros e melhorar o futuro para as crianças e famílias no nosso país.

Referências Bibliográficas

Antunes, S., Fuertes, M., & Moreira, J. (2021). Um olhar sobre a grande prematuridade: a investigação com bebés nascidos com menos de 32 semanas de gestação. Em. Fuertes, M., Nunes, C., Rosa, J., Almeida, A. R., Esteves, S.(Eds.), Teoria, práticas e investigação em intervenção precoce (II, pp. 25-48). Escola Superior de Educação, Instituto Politécnico de Lisboa. http://hdl.handle.net/10400.21/13046

Barbosa, A. R. F. (2015). Consequências da prematuridade no sistema respiratório. [Artigo de revisão]. Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra.

Cunha, M. (2018, novembro). 1 em cada 10 bebés nasce prematuro. Atlas da Saúde. https://www.atlasdasaude.pt/publico/content/1-em-cada-10-bebes-nasce-prematuro

Lopes, L., Sousa, C., Fonseca, H., Carvalho, I., Marcão, A., Rocha, H., & Vilarinho, L. (2018). Prematuridade e Rastreio Neonatal. Repositório Científico do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge. https://core.ac.uk/download/pdf/187758885.pdf

Ordem dos enfermeiros. (2021, novembro). Dia Mundial da Prematuridade. https://www.ordemenfermeiros.pt/eventos/conteudos/dia-mundial-da-prematuridade/

Organização Mundial de Saúde. (2022a, novembro). Nascimento prematuro. http://www.who.int/mediacentre/factsheets/fs363/en/

Organização Mundial de Saúde. (2022b, novembro). Lançamento das recomendações da OMS para o cuidado do recém nascido prematuro ou de baixo peso. http://www.who.int/news-room/events/detail/2022/11/17/default-calendar/launch-of-the-who-recommendations-for-care-of-the-preterm-or-low-birth-weight-infant

Pintassilgo, S. I. G. C. (2014). O Risco e as Condições Sociais e Assistenciais da Maternidade em Portugal [Tese de Doutoramento]. Iscte ‒ Instituto Universitário de Lisboa.

Ramos, H. A. C., & Cuman, R. K. N. (2009). Fatores de risco para prematuridade: pesquisa documental. Esc. Anna Nery Ver Enferm, 13 (2), 297- 304.

Santos, S. E. (2021, novembro). Prematuridade em Portugal. Atlas da Saúde. https://www.atlasdasaude.pt/publico/content/prematuridade-em-portugal

Sereno, R. A. R. M. (2013). Prematuridade e Desenvolvimento: Competências Pré-Académicas num grupo de crianças nascidas prematuramente [Dissertação de Mestrado]. Faculdade de Educação e Psicologia – Porto.

Sociedade Portuguesa de Pediatria. (s.d.). Dia Mundial da Prematuridade. https://www.spp.pt/noticias/default.asp?IDN=372&op=2&ID=132